A legítima é a quota que incide sobre os bens da herança de que o testador não pode dispor, por ser legalmente destinada aos herdeiros legitimários, que no caso de um casal é de 2/3 do valor total dos seus bens.
São inúmeras as razões que levam muitas vezes os autores da herança a dispor em vida dos seus bens como entendem e, apesar de estarem na maioria das vezes cientes da fragilidade e até, por vezes, ilegitimidade dessa decisão, assumem-na como sendo a sua última disposição de vontade.
Os pais, em vida, doam muitas vezes alguns ou a totalidade dos bens de que eram titulares a favor de um filho em detrimento dos restantes filhos, verificando-se que por sua morte nada mais resta para herdar.
Tal doação dos pais não é originariamente ilícita, pois que somente após a abertura da sucessão com a morte é que se poderá verificar se a mesma violou a proibição de dispôr de mais de 2/3 dos seus bens. E isto porque até à sua morte ainda poderiam adquirir outros bens que viessem a integrar a sua herança sem violação daquela quota legítima.
Os restantes filhos do casal foram assim afastados da herança, quando apenas o podem ser em situações muito excecionais, quer por via da deserdação, sendo privados da sua legítima quer quando é declarada judicialmente a sua indignidade sucessória, ficando consequentemente desprovidos de capacidade sucessória.
No caso em que haja doação em bloco a favor de um dos filhos, para o cálculo da legítima, da herança do casal, deve atender-se ao valor dos bens existentes no património do autor da sucessão à data da morte de ambos, ao valor dos bens doados, às despesas sujeitas a colação e às dívidas da herança, com vista à sua integralidade, com eventual redução, por inoficiosidade, da doação, ou à mera igualação da partilha (nº 1 artigo 2104º do C.C.).
A forma de dirimir as questões que se colocam a esta partilha – a sujeição a colação dos bens doados ou inoficiosidade da doação – na falta de acordo entre os herdeiros é o recurso a inventário, a ser instaurado junto do tribunal competente.
Assim, por força da doação feita a um herdeiro legitimário, terão de ser relacionados os respetivos bens com a indicação do valor que têm no momento de abertura da sucessão, nos termos das normas ínsitas nos artigos 2109º nº1 e 2 e 2031º, do Código Civil;
Muitas vezes os donatários fixam a sua residência em bens imóveis que lhes foram doados e nessa medida fazem obras para garantir condições de habitabilidade, nomeadamente retelho da moradia, recuperação de paredes e pinturas. São as chamadas benfeitorias necessárias e úteis feitas pelo donatário nos bens doados, que a jurisprudência e doutrina dominante é do entendimento que deverão ser tidas em conta para que o seu valor seja descontado no valor daqueles bens.
Significa que no momento da partilha a valorização económica resultante das benfeitorias é tida em conta, no valor que é atribuído ao bem doado, fazendo-se uma avaliação ao valor do imóvel sem as obras e com as obras separadamente.
Assim, o filho (o donatário) terá direito a receber o valor das obras que fez na moradia que lhe foi doada pelos pais, mas a partilha terá de ser feita de forma que não ofenda a legitima dos seus irmãos que é de 2/3 da herança, tendo os mesmos direitos a receber o respetivo valor.
Por Judith Teodoro,
Advogada