De acordo com o art.º 21.º n.º 1 do Regulamento (UE) n.º 650/2012 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 04 de Junho de 2012, a lei aplicável ao conjunto da sucessão é a lei do Estado onde o falecido teve a sua última residência habitual no momento do óbito.
Tomando por referencia o aludido exemplo, ou seja, quando o local do falecimento, tenha ocorrido na última residência habitual do de cujus, por exemplo na província de Ontário no Canadá, trata-se em primeira linha em enquadrar a natureza jurídica daquela país. E isto porque, sendo o Canadá um estado constituído por várias províncias, cada uma delas com legislação própria em termos sucessórios, por força do art.º 36.º n.º 1, conjugado com o mesmo art.º 36.º n.º 2 al. a) do Regulamento Europeu, resulta que a lei aplicável a esta sucessão é a lei da província de Ontário no Canadá, dado que o Canadá não tem normas internas de conflitos de leis.
Assim sendo, consultando a lei de Ontário no Canadá, denominada “Sucession Law Reform Act, R.S.O 1990 CHAPTER S.26”, cuja consulta foi efetuada através do site oficial da Província de Ontário https://www.ontario.ca/laws/statue/90s26, adiante designada por S.L.R.A., verifica-se que na secção 36 da S.L.R.A, existe normas de conflitos, aplicáveis à sucessão no caso da testadora não ter feito testamento (Intestate Succession).
Quando o de cujus falece sem testamento, nos termos da (Seccção 36, Subsecção (1) S.L.R.A.), a sucessão imobiliária (interests in land) é regida pela lei do local onde os imóveis se situam, por reenvio da lei de conflitos do Ontário, estando assim preenchidos os pressupostos da aplicação do art.º 34.º n.º 1 al. a) do Regulamento da União Europeia, visto que a legislação da província de Ontário no Canadá não se considera competente.
Já a sucessão de bens móveis (interests in movables), nos termos da (Secção 36, subsecção (2) S.L.R.A), é regida pela lei do Ontário no Canadá. –
Sendo assim, no caso do de cujus ter bens imóveis situados em Portugal, deve ser o direito sucessório português a regular a sucessão. No caso de só ter deixado bens móveis ou imóveis apenas no Canadá, deve ser a lei do Ontário a regular a sucessão.
O mencionado Regulamento da União Europeia em vigor na ordem interna portuguesa, poderá colocar em causa normas de direito internacional, nomeadamente na parte que possa colidir com as regras de sucessão legitimária. Como recentemente terá confidenciado uma Notária após a outorga da escritura de habilitação de herdeiro, que a aplicação das normas de direito sucessório de outro país em Portugal que afaste herdeiros legitimários é uma questão a ser dirimida em sede própria, ou seja nos Tribunais, cabendo-lhe apenas celebrar a escritura em cumprimento do Regulamento da União Europeia. A jurisprudência ainda é muito parca relativamente a este tema que toca a todos nós.
Por Judith Teodoro
Advogada,