A Maria e o João decidem renovar a cozinha e, para isso, contratam uma empresa para o fazer, fazem o projeto, assinam o contrato de empreitada e procedem ao pagamento de um sinal.
artigo publicado em diversos jornais e rádios – 09/07/2025
O empreiteiro aparece no dia e hora combinados para início da obra e o projeto desenvolve-se, mas, entretanto, as coisas
começam a correr mal: o fornecimento dos azulejos atrasa-se sem justificação, as prateleiras são de madeira com qualidade inferior ao acordado e no final fica ainda a faltar o acabamento dos armários com tinta adequada. A Maria e o João decidem falar diretamente com o empreiteiro, mas o mesmo não apresenta soluções e nega qualquer responsabilidade. O que podem a Maria e o João fazer?
Esta situação poderia ser real e é apenas uma entre muitas em que o incumprimento pode dar lugar a um pedido de indemnização à luz da lei portuguesa. Mas então, como se traduz este incumprimento contratual? E quando pode haver lugar ao pagamento de uma indemnização?
Estabelece o art.o 798.o do Código Civil (doravante designado por “C.C.”) que “O devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor.” Assim, quando uma das partes não cumpre com a obrigação
a que está adstrita por força do contrato, ou cumpre-a parcialmente, fá-lo de forma incompleta ou tardia-
mente, pode ser condenada a indemnizar a outra parte pelos prejuízos causados.
O incumprimento pode ocorrer de várias maneiras: total, se nada do que ficou prometido é feito; parcial, se apenas uma parte da obrigação é cumprida; defeituoso, se o que é entregue não tem a qualidade acordada; e tardio, se a é cumprido demasiado tarde
e sem justificação.
Então, que tipo de danos a indemnização pode cobrir? Os mais frequentes são os danos patrimoniais, que se traduzem em prejuízos com efeito económico imediato, tal como custos de reparações, despesas inesperadas e lucros que deixaram de surgir. Também pode haver danos não patrimoniais, tais como a criação de desgaste emocional. Estes, no entanto, são menos comuns e exigem uma prova clara. O artigo 562.º do C.C estabelece que quem tiver o dever de indemnizar deve repor a situação que existiria se o dano não tivesse ocorrido.
A forma de proceder começa por averiguar se houve efetivamente um incumprimento contratual culposo, se esse incumprimento causou danos à outra parte e o valor do prejuízo, patrimonial ou não. Neste passo, é fundamental juntar toda a documentação (e-mails, mensagens, fotos, contratos, faturas) e testemunhas se existirem. Se todos estes elementos se alinharem
com os requisitos da responsabilidade contratual, tal como estabelece o art.o 799.º, a parte que se encontra em incumprimento terá a obrigação de indemnizar. O primeiro passo seria contactar formalmente o devedor para interpelar para cumprimento da obrigação, através de carta registada com aviso de receção ou de proposta extrajudicial, redigida por advogado ou solicitador. Muitas vezes, este contacto permite resolver o litígio sem recurso aos meios judiciais (tribunais).
Não existindo essa possibilidade, deverá intentar-se uma ação judicial para exigir o cumprimento da obrigação contratual e o pagamento de indemnização no tribunal competente, onde será requerido o reconhecimento do incumprimento e a condenação do devedor no pagamento de uma indemnização pelos prejuízos causados.
Se está perante uma situação de incumprimento contratual, saiba que não está desprotegido, a lei portuguesa prevê mecanismos de reparação dos danos causados e responsabiliza o devedor. O acompanhamento de um advogado é essencial para garantir o pleno exercício dos seus direitos e evitar que o prejuízo recaia sobre si.
Judith Teodoro,
Advogada
Com a colaboração das colegas,
Catarina Menezes e Filipa Cabral