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Herdeiro ou Devedor? ⚖️

Jan 2, 2025

Imagine que Alberto faleceu, deixando a sua filha Maria como única herdeira. Maria, ao saber do falecimento do pai, ficou preocupada, pois sabia que este teria acumulado várias dívidas ao longo da sua vida.
Sem ter conhecimento dos seus direitos (e também deveres) enquanto herdeira, Maria questionava-se: “Será que vou herdar as dívidas do meu pai? O que acontecerá se a herança não for suficiente para pagar essas dívidas? Estarei eu própria obrigada a assumir essas obrigações financeiras?”

Surgindo estas questões, é importante esclarecer e até desmistificar certas suposições quanto à herança – quando falamos no conceito de herança surge muitas vezes a questão da herança de dívidas, por isso é importante esclarecer que, nos termos do artigo 2068º Código Civil e seguintes, a herança responde pelo pagamento de dívidas e outros encargos, na ordem prevista
neste mesmo artigo. Deste modo, quando se inicia um processo de sucessão onde existem dívidas, a Maria pode repudiar, aceitar ou aceitar a benefício de inventário (art.º 2052 CC). Quando se trata de aceitação pura e simples, a Maria será responsável pelo pagamento da dívida, diferente da aceitação a benefício de inventário, que resulta na realização de um inventário, respondendo pelas dívidas os bens inventariados (art.º 2071 CC).

O processo de inventário consiste na divisão e administração dos bens, direitos e dívidas do falecido, com o objetivo de transferi-los para os herdeiros ou legatários, avaliando-se todos os ativos e passivos, de modo a fazer uma justa distribuição. Após a avaliação de todo o seu património, este servirá para liquidar a dívida, e voltando ao exemplo referido inicialmente, no caso de o valor da herança de Alberto ser superior ao valor da dívida, a Maria irá herdar a diferença entre estes valores, livre de qualquer encargo. No caso do repúdio, a Maria deixa de ser herdeira na sua totalidade, deixando de ser também responsável pelas dívidas da herança.

Outra situação será aquela em que o falecido possua dívidas que ultrapassam a sua própria herança – a isso chamamos de herança deficitária. No caso de Alberto ter um valor de dívidas que seja superior à herança que deixou, a Maria não está obrigada a pagar valores que ultrapassem a totalidade do que recebeu a título de herança. Por outras palavras, nunca podem ser “atacados” os bens pessoais de Maria, apenas os da herança, esgotando-se aí. A única questão é que cabe a Maria o ónus da prova (provar que há uma herança deficitária), nos termos do número 2 do artigo 2071º CC. Esta norma tem como objetivo garantir segurança jurídica e
evitar uma injusta transferência de responsabilidades para os herdeiros.

Desta forma, a afirmação de que os herdeiros herdam as dívidas não é totalmente verdadeira, uma vez que as obrigações financeiras do falecido foram restritas ao valor da herança. Se o montante for suficiente, tal quantia será paga aos credores e o restante será
para herdeiros. Caso contrário, se for negativa ao crédito, os herdeiros não possuem obrigação de pagar a
quantia restante.

Esse mecanismo jurídico é o que proporciona a conciliação entre o direito dos credores e o direito dos
herdeiros, proporcionando segurança ao processo de
sucessão.

Judith Teodoro,

Advogada

Com a colaboração das colegas,

Catarina Menezes e Filipa Cabral