Tem-se vindo a verificar que, cada vez mais, surgem dúvidas acerca da utilidade e validade de um testamento, sendo visto muitas vezes como uma solução para futuros problemas no processo sucessório, tentando-se assim, através dele, evitar conflitos entre herdeiros. Porém, nem sempre é o mecanismo ideal para este fim, e por isso, esclarecemos como e quando este é o meio adequado para tal.
artigo publicado em diversos jornais e rádios – 11/06/2025
O testamento segundo o art.o 2179o do Código Civil (adiante designado “C.C.”) consiste num “ato unilateral e revogável, pelo que uma pessoa dispõe para depois da morte, de todos os bens ou de parte deles”, isto é, um documento onde alguém declara o destino dos seus bens depois da sua morte. Poderá ser celebrado um testamento público, perante um Notário, num cartório notarial, onde será lido em voz alta na presença de duas testemunhas; ou cerrado, escrito pelo próprio testador ou outra pessoa, mas deverá
ser entregue ao notário, que irá lavrar um termo de abertura e autenticar; ou particular, menos comum, que só será válido em situações excecionais, como perigo de morte, facto este que terá de ser confirmado pelo tribunal.
Este ato só será válido, se o testador o realizar na plenitude das suas faculdades, isto é, perfeitamente consciente do ato que está a realizar. Caso contrário, se o testador não tiver “exprimido de forma clara a sua vontade, mas apenas por sinais ou monossílabos, em resposta a perguntas que lhe fossem feitas”, o testamento não irá produzir quaisquer efeitos (artigo n. 2180.º do C.C.).
No entanto, em Portugal, um testador não pode dispor livremente da universalidade dos seus bens, existindo sempre uma proteção dos seus sucessores legais. Existe sempre uma parte dos bens que é destinada obrigatoriamente aos herdeiros legitimários, filhos, o cônjuge e, na sua ausência, os pais. Esta parte da herança é designada de quota indisponível que são dois terços da totalidade dos bens. O resto será a quota disponível, um terço, dispondo o testador como melhor entender, seja atribuindo a amigos, caridade, um familiar mais afastado, etc. É importante sublinhar que, se o falecido tem nacionalidade estrangeira e residia habitualmente fora de Portugal, poderá, mesmo assim, redigir um testamento em território português, desde que possua propriedades em Portugal. Para estas situações, em regra, a sucessão será regida pela lei do domicílio do testamentário no momento do falecimento, conforme estipulado pelo Regulamento (UE) n.º 650/2012, podendo este ainda assim optar para que a sua nacionalidade passe a prevalecer, devendo fazer uma declaração expressa no testamento.
Desta forma, o testamento é um instrumento jurídico que, como muitos outros, contem os seus limites e possibilita ao testador expressar o seu desejo quanto ao destino dos seus bens após a sua morte. Assim, para evitar possíveis obstáculos, a vontade expressada em testamento deve acompanhar todos os requisitos legais, mantendo o equilíbrio entre as disposições e os direitos sucessórios de todos os herdeiros legitimários.
Assim, a redação cautelosa do testamento, de preferência com acompanhamento jurídico, é fundamental para assegurar que as disposições nele contidas sejam válidas, eficazes e cumpridas conforme a vontade do testador.
Judith Teodoro,
Advogada
Com a colaboração das colegas,
Catarina Menezes e Filipa Cabral