A união de facto – ou “commonlaw marriage”, assim formalmente conhecida em inglês – em Portugal é uma forma legítima de união entre duas pessoas que vivem em condições análogas às dos cônjuges há mais de dois anos, independentemente do sexo. Embora a união de facto apresente se melhanças relevantes com o matrimónio, os efeitos jurídicos são distintos, sobretudo em caso de falecimento de um dos membros da união. Esta distinção torna-se particularmente relevante na proteção da morada de família, no acesso a pensões e subsídios e nos direitos à herança do unido de facto falecido.
Relativamente à morada de família, se a casa onde o casal vivia era bem próprio do unido de facto falecido, o sobrevivente tem o direito de continuar a habitar no imóvel e utilizar o seu recheio por cinco anos após o falecimento. Porém, se a união de facto tiver durado mais de cinco anos, esse direito estende-se por um período igual ao da duração da união, após esse prazo, o sobrevivente
pode permanecer no imóvel como arrendatário, pagando uma renda ao preço de mercado, e detém ainda direito de preferência caso o imóvel venha a ser vendido. Por sua vez se a casa morada de família era um bem de ambos, o direito de habitação exclusiva aplica-se da mesma forma — por cinco anos ou pela duração da união, se superior.
Se a casa morada de família for arrendada, o sobrevivente pode suceder na posição de arrendatário, desde que viva na morada há mais de um ano e não tenha outra habitação própria ou arrendada na mesma área (concelho de Lisboa, Porto ou seus
limítrofes, conforme o caso).
O sobrevivente pode requerer junto da Segurança Social, o subsídio por morte (disponível se a união tiver durado mais de dois anos e nenhum dos unidos de facto tiver sido casado anteriormente), a pensão de sobrevivência, desde que a união de facto exista há mais de dois anos e em condições análogas às do casamento. Existe, também, a possibilidade do unido de facto requerer e a pen-
são de alimentos da herança que, nos termos do art. 2020.º do Código Civil, pode ser reclamada se o sobrevivente demonstrar dependência económica. Para ter acesso a qualquer uma destas prestações, é essencial provar a existência da união de facto, podendo essa prova consistir numa declaração emitida pela Junta de Freguesia da área de residência, uma declaração fiscal conjunta (IRS), inscrição conjunta na Segurança Social ou no Serviço Nacional de Saúde ou comprovativos de residência comum (por exemplo, contrato de arrendamento ou escritura em nome de ambos e até mesmo faturas de despesas da casa em nome de ambos).
Ao contrário do cônjuge, o unido de facto sobrevivente não é herdeiro legitimário. Ou seja, não tem direito automático à herança do falecido. Para serconsiderado herdeiro, é indispensável a existência de testamento a seu favor, no qual o falecido dis-
pôs em vida da quota disponível — a parte da herança que o testador pode dispor livremente sem ofender a legitima. Sem essa disposição expressa, o sobrevivente não participará na sucessão.
Assim, embora a legislação portuguesa reconheça efeitos jurídicos à união de facto e alguns direitos análogos aos dos cônjuges, não deixam de existir várias distinções relativamente quando se fala no falecimento de um dos parceiros. A sua eficácia irá depender da prova da união de facto e da adoção de medidas jurídicas complementares.
Judith Teodoro,
Advogada
Com a colaboração das colegas,
Catarina Menezes e Filipa Cabral